Tenho sede, uma absurda vontade de goles grandes de palavras "malditas" (...)

Minha eterna volta!



Não mesmo. Não estou insinuando que voltar é a melhor parte da viagem. Voltar no sentido de se encontrar, se perder nas contagens dos paralelepípedos da calçada da infância... Voltar a ter lembranças de tempos já idos, de momentos que fizeram parte do grande quebra-cabeça que é a nossa vida. Em meio ao caos da nossa rotina, assistir a um pôr-do-sol, é para poucos, realmente. Assistir o quebrar das ondas do mar nas rochas... 

Isto sim é poder voltar, é sentir o que se imaginava ter esquecido, e como é bonito este sentir, uma mistura intensa de cores, de gostos e sons. Nenhum lugar do mundo é melhor que dentro de nós, isto já sabemos, mais o gosto de se fazer uma viagem e se deliciar em tons esquecidos...Ah! Não tem preço. A praia é a mesma, a rocha ainda lá, embora mais esculpida pelo tempo. O jardim ainda verde, pouco florido devido o inverno, mais o cheiro ainda o mesmo. 

O pé de jamelão ainda dá fruto, o viaduto ainda tem pichação, o relógio da rua ainda marca a temperatura e o dia, ainda se vê crianças correndo no horário escolar. As vans ainda estacionam nos mesmos lugares e ônibus ainda freneticamente param longe do ponto, lar doce lar... O sol ofusca os olhos mal dormidos, toda manhã, e ainda queima na pele, uma sensação assustadora e deliciosa ao mesmo tempo. “ Eparrê. Aroeira beira de mar. Canôa Salve Deus e Tiago e Humaitá”. Rojões ainda são soltos, porque é festa julina, porque o povo quer festejar. O calçadão ainda é de calcitas e basaltos. O chopp ainda é gelado e grandes musas ainda estão em Ipanema. Volto no tempo miúdo quando estou lá, bem lá onde o vento é brando e o café é quente, o chá mate que me embriago e semáforos que demoram acender o verde. 

Volto ao encanto de caminhar pelas ruas mal construídas, com cimentos gastos pelo tempo...Tempo! O que seria da minha viagem sem ele? Um breve soneto minha’alma rima, um rimado de amor, de valsas bem bailadas e batuques nas mesas de bares, o pé pede ainda muito samba... E voltar ainda é uma busca, nas alamedas onde tanto pensei, nas escadarias onde por míseros instantes chorei...Voltar é sempre preciso, é como abraçar o velho amigo, ou acenar para o “Bob Marley”, o famoso mendigo do bairro. Voltei para deixar mais um parte de mim, uma pequena parte feito aquele imenso mar, deixei mais lembranças e muito mais sorrisos. 

Um pouco de mim apenas basta agora, para eu continuar a navegar no meu próprio oceano. “ E cada verso meu será. Pra te dizer que eu sei que vou te amar. Por toda minha vida. Eu sei que vou chorar. A cada ausência tua eu vou chorar. Mas cada volta tua há de apagar. O que esta ausência tua me causou”. Guanabara... Meu Rio de Janeiro... Meus braços te abraçam e te acalantam tardes e noites, até o fim dos meus dias. “Isto só porque... Rio eu gosto de você”.



Pássaro negro



Já não sou aquele pássaro feliz
Não sou da paz e nem da guerra
já não tenho alma, nem canto
nem choro no dia-a-dia.

O caos consome meu céu
Minhas asas já não voam mais
sou apenas um pássaro solitário
e nada mais me define.

Quero ser novo
quero ninho e colo.

Sou uma ave de luto
e já não me cabe viver
e pra que preciso voar?

Pertenço a escuridão
a madrugada fria
e isto me torna mais um
ou uma coruja barulhenta da noite
faço parte do vazio,
das noites.

E aguardo uma manhã mais longa.

E assim consigo viver mais um dia

Busca e Desapego



Nas minhas andanças pela Internet, a procura de reflexões e mensagens para minha vida, sabe aqueles momentos que precisamos de singelas palavras? Foi exatamente assim, na minha busca por palavras sobre amor, e sobre espiritualidade, me deparei com as palavras do escritor Flávio Siqueira, compartilhadas com muito carinho pela Caricaturista Ana Paula Medeiros: “Como desapegar das pessoas que amo? Você sugere que eu abandone pais, cônjuge, filhos… Isso é desapego?”. 

Amor é uma coisa, apego é outra. No primeiro caso, a base é a liberdade. No segundo, o sufocamento, o auto engano. Quem ama enxerga. Discerne a hora de ir, voltar, dizer, calar. Amar implica em ser sábio, paciente para maturação dos processos. É preciso ter calma para entender o tempo de cada coisa. É preciso ter calma e enxergar-se. 

Há situações difíceis envolvendo pessoas que se amam. Pais que sobrecarregam os filhos, cônjuges que não se respeitam mais, amigos que não se perdoaram, gente vinculada por alguma magoa, pesada como uma corrente presa aos pés, tropeçando, caindo, tentando levantar. Desapego é livrar-se da corrente, jamais das pessoas. Pode ser preciso afastar-se por um tempo para se recuperar, ter seu próprio espaço, mudar de ambiente. Talvez seja o contrário, hora de aproximar-se, diminuindo a distância que gerou o mal entendido, quem sabe uma conversa franca e aberta seja suficiente? Não há fórmulas prontas. Apenas livre-se das correntes e saberá o que fazer. Isso é desapego. Você pode pensar que “se apegou” a alguém. Isso é impossível. 

O apego está ligado à sua insegurança, aos seus medos, vazios, que se projetam em alguém. Você não está preso à pessoa, mas em si mesmo. Podem ser pais, amigos, marido, esposa, filhos, até o cachorro. Conheço uma mulher com quase 40 anos que trata seu bicho de pelúcia como filho. O apego não está no bicho, mas nos vazios dela. O bicho só recebe essa carga. Ela não precisa se livrar do bichinho, mas encarar seus vazios. Desapego é abrir mão do excesso. É a coragem de enxergar-se nos maus entendidos, assumir sua responsabilidade nos desgastes, repensar até que ponto tem contribuído para que as coisas estejam fora de controle. É livrar-se da corrente e prosseguir com leveza, em amor. Amor gera auto crítica porque amor é consciência. 

É a gênese das desconstruções, do livrar-se da sobrecarga, do silêncio necessário para entender as causas, enxergar aonde tem errado, ter coragem para abrir mão do que precisa ficar para trás. Jamais abandone as pessoas, ainda que em alguns casos a distância seja necessária. Jamais se omita diante da necessidade de alguém, mesmo que existam situações aonde o silêncio é mais eloquente. Nunca mate outro ser humano dentro de você, mesmo que seja importante afastar-se. Desapego é enxergar-se no que te aflige, seja o que for, abrir mão do sentimento de vítima, entender aonde alimenta os processos e assumir que não precisa ser assim. É pacificar-se e prosseguir, amando as pessoas em liberdade, deixando as correntes pelo caminho." 

 E mais ainda sobre a nossa eterna busca... “Toda busca espiritual deve levar ao encontro com o próprio buscador. Buscamos sem saber direito a razão, como se um vazio nos movesse na tentativa de preenchê-lo, ainda que quase nunca saibamos o que está realmente faltando. Santo Agostinho dizia que esse vazio somente seria preenchido por Deus, que é o espaço onde ele cabe, só ele, e então transformaram Deus em um negócio extremamente lucrativo. 

O tal "espaço de Deus" virou outra coisa e o vazio ficou entulhado. Despejaram Deus de dentro e disseram que está fora, nos templos, nas religiões, nos livros, fora, sempre fora. Nos perdemos em nossa busca quando deixamos de olhar para dentro. Nos perdemos e o vazio ficou barulhento. Nos perdemos e o caminho ficou confuso, as palavras difusas, os sentimentos enganosos, nos perdemos. É preciso encontrar-se. Saber que o vazio é a falta de nós mesmos, sufocados por tantos condicionamentos, tantas crenças, tantos medos, tanta culpa, tanta coisa que disseram que deveríamos ser. Nos transformamos em sub produtos culturais, reagimos a estímulos, nos moldamos conforme o ambiente, o tempo, a sociedade, a cultura, os interesses, as crenças, até percebermos que estamos longe. Saudade de nós mesmos. 

Nenhuma busca espiritual será frutífera se não houver espaço para o reencontro. Desintoxicar-se do ego, reconectar-se com o próximo, vincular-se à vida, perceber-se em tudo. Encontrar-se é ser quem é. Esvaziar-se. É desentulhar o "espaço de Deus", aceitando as desconstruções necessárias, se expondo a luz da consciência, até que tudo esteja limpo, vazio, desobstruído, espaço em silêncio.  

Não precisamos preencher vazios, precisamos retomá-los para que então nossa busca nos revele quem somos, nos preencha de Deus. Talvez Santo Agostinho tivesse razão”. Vamos refletir!

Crônica --> Canalha




Estive pensando nestes dias sobre canalhas. E também por coincidência passou um canalha em minha vida. Um não, vários! Como passa na vida de qualquer um, todo dia. Canalha, uma pessoa sem moral e verdadeiramente um patife. Canalha também é o rótulo que a sociedade dá ao homem que procura a mulher com finalidades outras que não os compromissos socioconjugais (namoro, casamento). Sedutor, possui habilidade para relaxar suas parceiras a ponto delas se sentirem desejadas por um homem que conhece a alma feminina e suas fragilidades. 

O canalha aparece quando a mulher deixa de se sentir especial pelo homem em questão. Tenho procurado uma definição para tal palavra e se poderia, de alguma forma, mudar este rótulo. Creio que não há! Desde que o indivíduo foi tachado por estas piores qualidades, não tem muito o que fazer mesmo.  Adorei o texto do jornalista Chico Garcia, que dizia: O canalha não tem jeito mesmo. E nunca terá. Ele é o sociopata do amor. Inspira confiança e expira mentiras. E você, na falta de algo melhor, vai respirando esse ar sedutor. No alto dos seus 1,70m de mulher independente, forte e sedutora, você sempre acha que pode consertá-lo. Esqueça, você está apaixonada e o antídoto para o canalha é o desprezo. O canalha finge que não é um canalha. Posa de bom moço, carente, apaixonado e infeliz. 

E você acredita ser a salvação dessa alma perdida, depois de tantas desilusões amorosas. O canalha cria uma nova identidade, mas sem registro em cartório. Ele age por instinto, não sabe ser de outra forma. A sedução faz parte da sua sobrevivência emocional. Ele é uma fera e você o prato de comida. Mas ele tem um jeitinho tão meigo, uma conversa tão bacana, não é mesmo? O canalha é inteligente, sagaz, enigmático e te faz rir. Pronto, o cara perfeito. O único porém é que ele nunca será completamente seu. Amar um canalha é entrega sem devolução. A submissão é ingrata: revolta, mas apaixona. O canalha é o disfarce da conquista, máscara do engano. E é justamente isso que te encanta nele. 

Ele sorri em versos, fala em melodia e te decifra com os olhos. O canalha parece ter o manual de instruções para seduzir. E faz isso sem nenhuma força. Você consegue ver sensualidade nele caminhando na rua, tomando whisky, acendendo um cigarro e até dirigindo. O canalha nem bonito é, mas parece ter nascido para desafiar o seu bom gosto. Ele faz você escutar músicas que você nem sabia que existiam, faz você pesquisar textos e frases que traduzam o que você está sentindo. Faz você acordar de manhã e lembrar dele, pelo menos, na hora de passar o perfume. O canalha não pede, manda. Você adora e depois se odeia. Tenta escapar e horas depois, cai numa armadilha. Mas não fique triste, o canalha é o "test drive" para qualquer corrida amorosa. É pré-requisito para as provas de amor. 

Toda mulher precisa de um bom e cruel canalha no seu caminho para encontrar o próprio valor. Somente depois de alguns meses mendigando atenção e se alimentando de mentiras cobertas por uma camada de ilusão, que você vai encontrar a correspondência do seu amor. Não nele, claro. Mas antes do coração achar o endereço certo para se apaixonar, é preciso primeiro ter garantias. É a conquista do chamado amor próprio. Amar um canalha faz parte da vida, é a construção de si mesma, leitura obrigatória para o vestibular sentimental que vem pela frente. Estar com um canalha é mais do que necessário. É gostoso". Vivemos a "Era Canalha", a verdade é esta. Não podemos rotular apenas os homens casados, e sim a sociedade, o mundo. E existem muitos tipos de canalhas. 

Por Bezerra da Silva: " Canalha, tu é um verdadeiro canalha. Rapinou o dinheiro do povo, Saiu esbanjando. E fazendo bandalha". Música dos Titãs:  Não tarda nem falha. Apenas te espera. Num campo de batalha. É um grito que se espalha. É uma dor. É uma dor canalha. Que te dilacera. É um grito que se espalha. Também pudera. Canalha! No livro de crônicas do escritor gaúcho Fabrício Carpinejar, ele mostra que o canalha mantém seu charme sexual. 

Interessantes frases: "Quando eu penso que já conheci todos os babacas e canalhas do mundo, percebo que a espécie é infinita". "E há mulheres tão canalhas que deveriam ter nascido homens". E termino contemplando Millôr Fernandes : "Se você agir sempre com dignidade, pode não melhorar o mundo, mas uma coisa é certa: haverá na Terra um canalha a menos". 

Mas será que a culpa é realmente inteira do canalha? Ele pode escolher o tipo que quer ser. E quando está  completamente inteiro, pode ser você ou... Eu.

A Tempestade



Hoje a tempestade avança por dentro de mim. Rodopia por entre as minhas dúvidas, me assombra. Me sinto um caos! Um pedido soa longe: “socorro”! E gritos me atordoam... O pequeno barco já partiu do cais, agora minha viagem não tem volta. 

Minha jornada na solidão começa assim, apenas um cais vazio, sem acenos ou despedidas. Apenas vou, com meus farrapos na pele e minhas verdades não esclarecidas. Meu barco passará pelas insônias e pelos rios vermelhos, e acordarei na neblina dos meus próprios sonhos. Estúpida e mansa, como na infância... Tola e covarde, como na juventude. Apenas sigo, navegando no mar de ideias, tentando não naufragar nas agonias presas na garganta, apenas sussurrar tem sido meu escape, breves e pavorosos. Louca! Uma voz suave ao meu ouvido, toda noite. 

Louca? Acho que já não é tanta loucura assim que me mantém. Deixei meu monstro interior preso no baú das minhas delícias, não sou dele mais, sou apenas uma moça que navega na imensidão das águas claras, procurando uma parte da infância, procurando outra metade. A tempestade é verdadeira agora e faz meu barco balançar de um lado para o outro, não tenho mais controle dele, nem de mim. O vento é forte, a tempestade me alcançou e agora faço parte dela... E ela consegue me atirar no mar gélido e sinistro, e agora faço parte dele, sou agora mais uma de suas ideias. 

E lentamente meu corpo se vai, feito um bailado em câmera lenta. E meu corpo cintila, vultos claros me envolvem, como se saíssem de dentro mim, saíam os medos e os pesadelos, saíam as sobras, os desamores... Acordei na praia. 

Uma praia colorida, sua areia brilhava feito cristal. Paralisei-me, olhando minhas mãos transparentes... Uma música soava, igual aquelas caixinhas com bailarinas... E eu corria ao encontro da música, as folhas no chão corriam comigo, e eu brincava com elas e sorríamos, éramos crianças... E cada folha era um sorriso, e eu já não sabia se era uma criança correndo ou uma daquelas estranhas folhas. O mar já não existia dentro de mim, já não sentia saudade do monstro que tranquei, e já não lembrava da tempestade... Sou agora apenas uma rocha ou flor? Uma folhagem que corre ou abismo sem cor? Fumaça do vulcão ou música secreta? Sou a caixinha ou a criança tentando dar corda? Estou perdida na praia, não estou?! 

O sol queima na pele... Já é manhã dentro de mim. A tempestade me abraçara forte, sou agora uma moça perdida, tentando achar o caminho de volta pra casa.
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