Tenho sede, uma absurda vontade de goles grandes de palavras "malditas" (...)

ABSTRATO by Mário Rezende



A gente precisa de carinho

para adoçar um pouquinho a vida.
Necessita saber que tem alguém
que pensa na gente com amor.

O distante pode parecer tão perto,
obra da inexplicável natureza,
que, às vezes,  parece tão injusta
por nos fazer  ficar no limite
entre o instinto, instigante, intrigante, atraente
e  a razão insossa, insípida, deprimente;
que só no descuido  permite acontecerem os desejos
que ficam vagando pelos pensamentos
e se  realizam nos sonhos.

A gente sente, às vezes, necessidade 
de sentir o gosto, o cheiro;
vontade de sentir o calor do roçar pele com pele
de olhar através da janela dos olhos 
e ouvir sussurros de amor
sob um cobertor de estrelas
e procurar encontrar sentido 
nessa trama , nesse drama,
apesar do prazer que dá pensar 
que é a outra parte de alguém
e se deixar levar pelo poder ilimitado
que a imaginação permite realizar.

O parceiro presente, às vezes, é só estímulo tátil
para impulsionar a excitação
e o aumento da tensão,
que nasce e morre dentro de cada um,
porque o clímax do prazer,
é individual, único,
solitário.

Catarina

Ela chegou desconcertada na sala de estar, ajeitou a mobília, aspirou o pó, trocou o cortinado.Certificou se os objetos estavam posicionados nos mesmos lugares de antes, de semana passada.   

As quartas-feiras sempre eram intensas... As roupas no cesto para serem engomadas no final do dia, o banheiro já estava com o ladrilho branco e cheiroso as onze da manhã, a louça e a prataria lavadas e  guardadas e Totó tinha dado o passeio matinal pelo quarteirão. Ainda os quartos, o quintal, a varanda para serem arrumados e varridos. 

A TV ligada no canal do seriado, de passagem de um cômodo para o outro, uma olhadela rápida para não perder o assunto, uma pausa para ajeitar o lenço na cabeça,   retirar a luva das mãos no intuito delas respirarem um pouco. 

Três da tarde... A casa “clean”, a blusa manchada e empoeirada de um dia de faxina, a dor de cabeça diária já apontava no lado esquerdo do cérebro. Pegou o envelope preso com um ímã na geladeira, seu pagamento semanal, colocou na bolsa que ganhara da patroa, apagou as luzes, deu voltas na chave da porta, segue ao ponto de ônibus. 

O primeiro carro perdeu, devido o atraso pouco, quarenta minutos depois, sobe no 438 rumo centro e de lá ainda o trem. Aquele cochilo básico batendo a cabeça no vidro da janela e lá fora a chuva fina cai no asfalto ainda quente do dia. Oito da noite... Ela chega à sala de estar da própria casa, certifica se a mobília ainda está lá, não houve roubo, a poeira ela deixa para o dia seguinte, com o corpo cansado e com o sono no rosto, segue para a cozinha preparar o jantar. 

Ainda dever de casa com as crianças, depois retirar o cheiro de cebola das mãos para o marino não reclamar... A avó faz o papel da mãe durante o dia, menos feriados, o marido não dormiu em casa, mais um plantão. Trim... O despertador soa quatro da manhã, pó de arroz para disfarçar as olheiras, Catarina se apressa para “tomar” a van até a Estação de trem, hoje tem a casa da Dona Berenice.

Jeito de amar



As virgens palavras envolvem o meu coração,

dissolvem pecados da minha carne...

Tu resistes aos poemas frágeis,

às sublimes frases de uma pequena poesia...

Te sigo nos instantes da melancolia,

nas tuas aflições,

obsessões e agonias...

A cama devora teu anoitecer a cada dia,

com sonhos galopantes,

sentes como um curto lençol...

As faíscas de prazer...

Estou nas tuas delícias,

com minhas manhãs de sono,

absorvendo lembranças, nada mais...

Sinto a fuga me levando para uma tarde sozinha...

Rasgo do meu peito as velhas recordações,

meu corpo pede as artimanhas do teu sexo,

do teu calor despido...

Sou capaz de invadir uma cadeia,

resgatar-te,

mesmo com uma granada presa ao pescoço,

covardes!

Ninguém ama deste jeito,

assim...
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