Lua
vivia choramingando pelos cantos do Hotel. Luan é o nome dele, um
rapaz especial, e apaixonado. Morador de um Flat no Rio de Janeiro.
Lua vivia só, conseguia cumprir as tarefas simples do seu dia-a-dia.
Era um rapaz de vinte e poucos anos e mentalidade de sete. Todos os
dias ele ia passear na rua e quando passava pela recepção fazia
questão de cumprimentar todos os funcionários, e gostavam dele, o
carinho era mútuo. Embora especial, Da Lua como era chamado pelos
amigos, sentia uma paixão avassaladora por uma funcionária do
Hotel, Luciana.
Seu maior sonho era se casar com ela, e não vê-la
mais limpando os quartos e escadas do Hotel de luxo daquele bairro.
Da Lua era rejeitado pela jovem. Toda vez que se declarava, e que
falava do seu imenso amor, voltava para seu Flat chorando. Luciana
não correspondia a este amor. Tinha vergonha do rapaz, pensava no
que iriam dizer se ela namorasse com ele. “Como posso namorar um
retardado?!” Era a frase que usava como desculpa quando suas amigas
perguntavam do romance. E na verdade não havia romance, apenas a
ilusão do Da Lua em ter sua amada, mais a amada não o amava e
jamais se renderia a esta expectativa louca. Da Lua dava-lhes
presentes... Caixas de bombons... Luciana aceitava com carinho, mais
não por amor. –Por que Luciana não quer Da Lua? O rapaz
ziguezagueava pelos corredores do Hotel perguntando aos hóspedes, na
esperança de ter uma resposta certa.
Um dia, Da Lua achou na lixeira
do seu andar uma boneca de pano, suja mais ainda linda. Dera de
presente para Luciana, que não gostou muito e jogou a boneca no
chão. –Tire esta boneca feia de perto de mim! Exclamava
endoidecida no saguão do Hotel. - Da Lua quer que fique com ela, ela
se parece com você. O rapaz apaixonado tentando explicar o presente.
Luciana ficou com raiva daquele momento, ali na frente de todos, sai
desesperada ao local de descanso dos funcionários, enquanto Da Lua
pegou carinhosamente a boneca do chão e levou-a para seu quarto e se
pôs a cuidar do tal achado como se fosse Luciana.
A boneca tinha um
coração com tinta vermelha desenhado no peito e cabelos cor de mel,
feito os de Luciana. Embora de pano e com as costuras desajeitadas,
Da Lua cuidava com muito carinho e se admirava com os olhos em forma
de cruz. Talvez tivesse sido a costureira do andar de cima que a
jogou no lixo, por ser velha e feia. Da Lua não estava nem aí.
Também não sabia o que fazer com os alfinetes que vieram presas na
boneca. Todos os dias ele ajeitava com cuidado e tentava fincar mais
para dentro da boneca, no intuito de deixa-la mais bonita. E assim,
ele se trancou para dentro de si, num mundo de tormentas e agonias.
Conversar com seu novo brinquedo era o que ele mais fazia, dia e
noite. A D. Dalva mãe de Da Lua, teve de ficar uns tempos com ele,
porque ele mal saída do quarto e nem na rua ia mais, nos passeios
que costumava fazer, era apenas ele e sua boneca, num universo de
sombras e Loucura, onde suas gargalhadas eram quase um adeus a
realidade e ao seu amor platônico. Luciana tirara licença do
trabalho e já alguns meses estava acamada, lentamente se esvaindo. O
amor tomou conta de si, e no auge de sua febre suplicava por Da Lua,
“DaLua, DaLua...” e ninguém entendera o porquê deste delírio...
Luciana estava morrendo por amor, seu corpo já não suportava tantas
cicatrizes sem significados, sangrando sem justificativas. Até um
padre da comunidade em que vivia fora chamado, até imaginaram
exorcizar a jovem, acontecia mentalmente com ela algo que não se
poderia explicar com palavras, era algo espiritual. Luciana estava
fraca, pálida.
E diante da morte que estava assombrando, podia-se
perceber uma lágrima verdadeira que caía no canto esquerdo do seu
rosto e seus olhos fixos no vaso de flores em cima de sua cômoda, o
último presente que recebera de Da Lua, junto com uma carta de amor.
A costureira do andar de cima, arrependida pela boneca jogada no
lixo, estava arrependida de ter brigado com a empregada do prédio, e
a vingança já não tomava seu coração.
E Da Lua na sua paixão e
demência, conectado mentalmente na boneca sinistra, que na verdade
era vodu.